ELEGIA
Noite longa na estrada.
E quando eu chegar, o que vou sentir?
Meu olho sussurra uma lágrima.
E quando eu te vir, como há de ser?
Meus pés faltarão, minha visão turvará?
Será dor aos soluços, desespero, maldição?
Fim da estrada. Nem vi que era dia.
Passos lentos, acolhimentos.
Entro no salão onde estás.
E não é tu que estás.
Onde, tuas mãos finas, trêmulas e ágeis,
de veias saltadas?
Onde, teu andar largo?
Onde, teu riso debochado?
Onde, teu olhar de cinzas,
céu de inverno em teu rosto fino?
Onde...?
Então entendo tudo.
Que não é ali que estás.
E que agora estás livre.
Rios lentos me cortam o rosto
na presença do teu silêncio,
no qual me calo.
Onde tua antiga voz forte
se tornou um esforço arfado,
agora o silêncio das bombas
que te mantiveram até a travessia.
E nesse silêncio, a certeza tranqüila
de que respiras tranqüilo outros ares.
Mão sobre teu peito, beijo tua testa
uma última vez, e me surpreendo.
Está gelada, tu está gelado.
- É claro – me dou conta. Não és tu.
Tu não estás mais lá.
O corpo, ali presente, rodeado de flores
não és tu.
O que tu és não está lá.
Está livre. Estás livre.